sábado, 30 de agosto de 2008


Gosto de imaginar realidades... realidades virtuais para acolher o ser moderno... quando imagino a minha realidade virtual, imagino uma rua de muitas casas iguais... diferenciadas por pequenos detalhes... imagino, à porta da minha casa virtual, uma grande acácia florida, com seus cachos de flores amarelas soltando, com o vento, pequenas pétalas no chão, colorindo a calçada em frente à minha casa... a casa em si, como todas as outras, tem um espaço na frente... na minha, há um canteiro de flores no centro do chão de cimento, com gerânios, begônias, azaléias e onze-horas coloridas, como na minha infância... no meio do canteiro tem um jasmineiro, que espalha perfume ao cair da noite quando os botões se abrem... junto ao colorido das flores tem sempre borboletas, beija-flores, joaninhas, grilinhos a cantar... nesse jardim fica uma ana, orgulhosa pelo florir de suas plantas... tirando folhas amareladas.... trocando a água dos bebedouros... ou às vezes só olhando a rua... a casa em si é antiga... pé direito alto... três degraus de pedra acima do nível da rua... varandinha com cadeiras de ferro e almofadas verdes... tem porão, tem telhado com forro de madeira... telhas vermelhas, paredes pintadas de azul clarinho... tem pintura descascada em alguns pontos, em outros, infiltração esperando consertar... lá dentro tem também algumas goteiras que já fazem parte do dia-a-dia, já se incorporaram à estrutura da casa... pode-se entrar de duas maneiras... pela porta da frente, pomposa, duas bandas de madeira, com janelinhas de vidro colorido... ou pelos fundos, atravessando um corredor comprido, ladeado de flores até chegar ao quintal... por onde você prefere entrar?

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Surpresas


a vida tem mesmo muitas surpresas... quantos caminhos se abrem onde a gente menos espera... quantos becos sem saída se transformam em pracinhas com coreto e igrejinhas, onde a gente descobre que a essência da vida, a essência da gente, é bem mais simples do que gostamos de pensar... se satisfaz com pouco (que em si já é tanta coisa boa)... com um gesto de carinho, de amizade, de compreensão, de cumplicidade numa travessura de criança boba, que só quer aprender a viver, que quer descobrir o mundo que lhe escapa das mãos, que quer mudar as cores, os nomes, as formas das coisas... a gente olha pro lado, às vezes, e se assusta com a sensação de estar caminhando em círculos... a surpresa é quando se percebe que o caminho não é o mesmo que antes... mas que tem uma mesma porta que não abrimos no passado e que se apresenta novamente para ser descerrada... o passado não volta, não... não deixamos os anos vividos para trás, nem os quilos que ganhamos pelo caminho... também não podemos voltar por onde viemos... mas podemos escolher abrir aquela porta e (re)descobrir o mundo por ali... outros caminhos, outras paisagens, outras experiências... que bom que podemos contar com alguém que nos oferece a mão... tanto faz se para guiar ou se para caminhar junto, mas uma mão amiga e terna... cheia de doces e guloseimas que nos alimentam a alma... cheia de incentivo e coragem naquele passo mais difícil que temos que dar... cheia de energia pra nos levantar da queda... cheia de doçura para nos afagar o ego... portas abertas, imagens desvendadas, novas trilhas, desafios, alegrias... surpresas reveladas... as boas surpresas que a vida nos oferece...


domingo, 17 de agosto de 2008

Latente



lá pelos idos dos meus quatorze anos, estava torcendo meus neurônios, que sempre funcionaram muito melhor na área de humanas, para aprender física... tava difícil... perguntei ao meu irmão, um sábio, o que era latente... ele me respondeu: latente é uma coisa que existe dentro da outra, mas não aparece, precisa de uma outra coisa para fazer despertar... ajudou?... mais ou menos... matutei até dormir... no dia seguinte, na hora da prova, surpreendentemente, sabia a resposta... latente é quando uma coisa tem calor, mas ainda não tá quente...
ah, os quatorze anos! pasou tanto tempo desde então...
eu tinha tanto medo... e ainda tenho, mas aprendi a disfarçar pra não despertar o olfato das adversidades...
eu era tão inocente... e ainda sou, mas aprendi a fazer cara de esperta, pra enganar os outros...
eu tinha tanta fé... e ainda tenho, mas agora duvido de tudo antes de acreditar...
eu não sabia quase nada... e ainda não sei, mas aprendi a brincar com os significados das palavras, fiz delas meu ofício, mas não elaboro mais conceitos em rimas...
ah! os quatorze anos! no fundo, acho que ainda sou a mesma pessoa, só que agora.... muito mais latente do que antes...




***






olha eu aí de novo, recorrendo às lembranças do meu tempo de estudo (ou será que são elas que recorrem a mim?).
enquanto tento entender esse negócio de coisa certa na hora errada e/ou coisa errada na hora certa, me veio à cabeça uma lembrança, mais remota ainda que a do estudo da física...
dessa vez eu estava aprendendo a multiplicar números negativos e positivos... essa coisa de mudar o sinal pra lá e pra cá... parecia jogo de advinhação... quando achava que era mais, era menos... quando achava que era menos, era mais (já naquele tempo o meu juízo de valor se mostrava confuso diante dos problemas... e só tem piorado desde então)...
mas, agora, quem viria me socorrer seria a minha irmã, que, pelo sempre soube, de ouvir dizer desde que era pequenininha, era a mais inteligente da família (e não é que isso é verdade mesmo?)...
bem, ela não podia me explicar só falando, tinha que desenhar também... ilustrar... concretizar o abstrato para que uma menina de seus nove/dez anos entendesse essa confusão...ela já sabia (no alto grau de sua experiência de irmã mais velha) que é mais fácil acreditar no que se vê, do que tentar entender o que outros dizem...
então, finalmente, enquanto desenhava, ela ia contando uma historinha...
"era uma vez uma baile, todos queriam dançar, mas para isso tinham que achar o seu par ideal... um sinal de mais achou outro sinal de mais, se conheceram, dançaram e o resultado foi positivo... um sinal de menos também achou outro sinal de menos, apesar de serem os dois um tanto negativos, a dança deu certo e o resultado também foi positivo...agora, tinham sobrado um sinal de mais e um de menos... esses tentaram dançar de um jeito, de outro, mas no fim das contas, o resultado foi negativo."
quando a história acabou de ser contada o desenho já estava pronto também... viam-se dois sinais de mais de mãos dadas, assim como os dois sinais de menos... seus rostinhos estavam felizes e ao lado havia os sinais de = +...
mas, havia também um sinal de mais e um de menos, juntos, mas com suas fisionomias tristes e, a seguir, os sinais de = - ...
é mesmo engraçado que, agora, com a cabeça tão cheia de problemas (que não são mais nem de física, nem de matemática), me venham à lembrança justamente esses momentos da infância, quando recorria aos meus irmãos, como fontes de farta sabedoria, para tentar entender as situações complexas (ô, saudade!) com as quais me confrontava... e, eles tinham (pasmem!), de fato, a solução... e, ainda, hoje, acredito que a tenham...
deveria ter estudado mais com eles... feito mais perguntas... de outras matérias, tipo, química, biologia, português...
deveria ter sido menos pretensiosa, achando que poderia entender tudo sozinha, e pedido que eles me ensinassem mais coisas... que grandes lições de vida haveria na raiz quadrada... nos produtos notáveis... nas cadeias sextavadas da química orgânica... na taxonomia dos seres vivos...
deveria, mesmo (aliás, acho que ainda há tempo), é fazer mais deveres de casa com meus filhos...
quanto ao meu dilema... hora certa/hora errada... a lembrança da carinha dos sinais já diz tudo...